domingo, 30 de outubro de 2011

Águias entre galinhas


Era uma vez um camponês que foi a floresta vizinha apanhar um pássaro, a fim de mantê-lo cativo em casa. Por sorte conseguiu pegar um filhote de águia, mas sabia que precisava educá-la para que seu instinto não prevalescesse, e pudesse se manter sempre submissa e sob sua posse. Colocou-o então junto com as galinhas, a fim de que crescesse e se comportasse como uma galinha. E isso de fato aconteceu.

Depois de cinco anos, esse homem recebeu em sua casa a visita de um amigo naturalista. Enquanto passeavam pelo jardim, o amigo avistou a águia, e comentou: “esse pássaro aí não é uma galinha. É uma águia”.

“De fato”, disse-lhe o homem. “É uma águia, mas eu a criei como uma galinha. Ela não é mais uma águia, é uma galinha como as outras”.

“Não”, retrucou o naturalista. “Ela é e sempre será uma águia, pois tem o coração de águia. E esse coração a fará algum dia voar às alturas”.

“Não”, insistiu o camponês. “Ela virou uma galinha, e jamais voará como águia”.

Então os dois decidiram fazer um teste. O naturalista tomou a águia, ergueu-a bem alto e, desafiando-a, disse: “Já que você de fato é uma águia, já que você pertence ao céu e não à terra, abra as suas asas e voe!”.

A águia ficou sentada sobre o braço estendido do naturalista. Olhava distraidamente ao redor, sem compreender o que queriam. Então ela viu as galinhas lá em baixo, ciscando migalhas, e pulou para junto delas. O camponês comentou: “Eu lhe disse. Ela pensa como galinha. Ela virou uma galinha”.

“Não!”, tornou a insistir o naturalista. “Ela é uma águia. E uma águia sempre será uma águia. Vamos experimentar novamente amanhã”.

No dia seguinte o naturalista subiu com o animal ao teto da casa. Então ele sussurou: “Águia, já que você é uma águia, abra as suas asas e voe!”. Ela não teve reação alguma, e quando viu lá embaixo as galinhas ciscando o chão, pulou para junto delas.

O camponês sorriu e disse: “Eu havia lhe dito. Ela virou uma galinha!”.

“Não”, respondeu firmemente o naturalista. “Ela é uma águia e não pode negar a sua natureza. Vamos experimentar uma última vez. Amanhã eu a farei voar”.

No dia seguinte o camponês e o naturalista levantaram bem cedo. Pegaram a águia e levaram-na para o alto de uma montanha. Faltavam poucos minutos para amanhecer, e os primeiros raios de sol começavam a surgir.

O naturalista ergueu o animal para o alto e ordenou-lhe: “Águia, já que você é uma águia e não pode negar a sua natureza, que é do céu e não da terra, abra suas asas e voe!”.

Ela então olhou ao seu redor. Tremia, estava sozinha e com medo, mas ao mesmo tempo sentia surgir uma sensação nova. Estava insegura, e não conseguiu voar. Vendo a hesitação do animal, o naturalista segurou-a firmemente, bem na direção do sol, de modo que ela conseguisse enxergar o tamanho do horizonte.

Naquele momento os seus olhos se encheram de luz, e depois de ficar momentaneamente sega, enfim enxergou a vastidão do horizonte. Foi quando abriu as suas potentes asas.
Ela experimentava uma vida nova. Sentia-se livre, uma sensação como nunca antes havia sentido. Ergueu-se soberana sobre si mesma e, como se soubesse desde pequena o que fazer, começou a voar. Voou e voou cada vez mais alto. Sentia desejo de mais, e maravilhou-se com o horizonte. Foi então que, guiada unicamente por seus desejos e instintos, ela seguiu em frente, até sumir no horizonte, e nunca mais retornou.

Nós como todos os povos do mundo fomos criados à imagem e semelhança de Deus. Somos águias por natureza, mas durante nossas vidas insistimos em viver como se fossemos galinhas. É preciso deixar o conforto de viver das “migalhas” que nos dão para comer, para sobreviver, e ter coragem de enxergar além, de vislumbrar o horizonte das possibilidades e abrir nossa mente para o desconhecido, para o novo. É preciso despertar a águia que existe dentro de cada um de nós.

Texto adaptado do original de Leonardo Boff, “A águia e a galinha: uma metáfora da condição humana”.

Abraço do Leo!

Nenhum comentário:

Postar um comentário